segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Série: entrevistas

Edna Dantas

Chefia o escritório da Radiobrás no Rio de Janeiro há 2 anos e meio.

Desafio

“O jornalista tem muitos desafios pela frente. Hoje tem uma figura nova que é o jornal online, muito rápido, muito ágil e que já causa um grande impacto na mídia impressa. Isso me preocupa por um lado. A questão da rapidez, eu tenho muito medo da informação errada, do prejuízo que ela causa muitas vezes. A gente não tem noção às vezes do quanto uma informação errada pode ser maléfica. Um instrumento que é de extrema utilidade, para o cidadão de uma maneira geral, quando ela é mal dada ou equivocada, traz um prejuízo enorme. Se não traz para a população em geral, mas pode trazer para um indivíduo. Isso é um custo muito alto. Eu reflito muito isso. A gente tem que ser rápido, é uma característica dessa profissão, obviamente que quem chega primeiro com a informação acaba se destacando do ponto de vista das empresas. Mas há uma série de riscos dentro disso.”

Jornalismo público

“A vantagem de se trabalhar numa empresa pública, talvez a gente não precise ter essa sede. Nós podemos ser rápidos, mas se tivermos que desacelerar para chegar com uma informação mais correta, podemos nos dar esse luxo. Não estamos competindo no mercado do ponto de vista comercial. A audiência é importância é obvio que é.

A gente tem muita coisa parecida, jornalismo é jornalismo em qualquer lugar, no caso da empresa pública, aumenta a responsabilidade. Do ponto de vista da empresa publica, quem está custeando isso é o publico de uma maneira geral, é a população brasileira, a nossa responsabilidade aumenta ainda mais. A gente não pode errar, a gente erra, mas não pode errar. A gente tem a obrigação de dar vozes ao maior número de pessoas. O jornalismo público tem muito esse papel de tentar se aprofundar mais nos assuntos. A gente está ainda muito distante nesse assunto. Tem espaço dentro das programações, a gente tem matéria de maior fôlego, a Rádio Nacional promove debates que a gente se aprofunda nos assuntos. Tem que trazer a discussão, temas que dizem mais respeito à vida das pessoas. A gente pode dar alguma outra abordagem. Isso tudo ainda é uma busca. A nossa estrutura é pequena, as emissoras públicas no Brasil não são grandes. Tinha uma cultura antiga, a gora está se conceituando mais o jornalismo público, como ele deve ser.

Com a tv pública, uma das funções é essa, abrir mais espaço para repercussões, mais reflexões. A gente tem que tentar trabalhar melhor esses formatos.

O rádio perdeu muito espaço para a tv, mas ele está se mostrando um veículo muito forte e que está permitindo aproveitar essas novas mídias, o rádio pela internet, por exemplo. O rádio tem longa vida, vai mudar porque a tecnologia está mudando. O advento do rádio digital vai permitir o volume de informação maior. O rádio ainda tem tudo para crescer e potencializar. O rádio é companheiro, continua sendo, está em qualquer lugar. Mas ele tem que se modernizar um pouco na linguagem, isso é um fator determinante para a sua sobrevivência, são adaptações. Nos formatos, a gente está precisando fazer mais radiodocumentário, sem ser chato, tentado usar de algumas ferramentas de sonoplastia, sonorização, trilhas. O som diz muito da realidade.”

O factual

“A gente tem que ter o factual, mas não pode perder de vista o processo, a contextualização, o acompanhamento do processo como fato, o fato tem um desenrolar. Muitas vezes, é comum a todos os veículos, fazer um acompanhamento das coisas. Às vezes dá um destaque no rádio, na tv, e esquece de acompanhar o que está acontecendo mais. Se o problema persiste. Esse é o ideal, mas há também toda uma questão de viabilidade econômica, os fatos vão se sobrepondo uns aos outros. A gente tem que na medida do possível buscar. Vai ter sempre aquele dia que não tem nada acontecendo, um vazio de notícias. Esses momentos seriam momentos para fazer algumas reflexões. Seria um momento do jornalismo ir a campo, deixar o telefone e o computador de lado.”

Papel do jornalismo

Edna concorda que o jornalismo tenha um papel de transformação social, “é um papel fundamental e cada dia, o papel é importante e a responsabilidade também. Quando a gente lança um fato e gera uma polêmica, por sermos formador de opinião, às vezes a gente esquece assuntos tão importantes que não estão na pauta dos jornais, meramente por uma polêmica, a polêmica pela polêmica. Mas acho que tem muita coisa boa sendo feita. Eu estou nesta profissão há quase 22 anos e não saberia fazer outra coisa. É claro que passo por crise como todo jornalista passa. Essa função social, às vezes quando você pára para fazer um balanço, o que será que eu consegui até hoje. Na verdade a imprensa tem conseguido muito. A gente vive um momento de um estado democrático onde se fala e se escreve tudo. Faz parte do processo de amadurecimento da imprensa. A gente passou muito tempo com a liberdade cerceada, eu acho que a gente se lambuzou muito no período da abertura, do governo Collor. Depois veio um vazio de notícias, sem muito critério. Tem a amadurecer muito ainda.”

O mercado

“Se eu fosse comprar com a minha época recém saída da faculdade, tem mais gente no mercado, uma competição maior, muitas universidades estão formando pessoas. Mas ainda continua a regra da qualidade, do empenho da dedicação. Por outro lado surgiram novos veículos e novas formas. Abriu-se caminho para aqueles jornalistas que querem trabalhar na assessoria de imprensa, na comunicação corporativa, tem também a internet que é um verdadeiro mundo a ser explorado e que pode gerar emprego, a questão do 3o setor, o rádio, as rádios comunitárias. Tem que ralar, tem que trabalhar muito. Tem duas questões: querer muito uma coisa e se dedicar. Essa profissão é uma profissão de dedicação. No início de carreira, o repórter tem que se mostrar aberto para trabalhar, e além disso tem que mostrar quem é bom. Tem gente, por exemplo, que nasceu para ser editor e pensar uma pauta, que nasceu para ser pauteiro, outro para ser repórter, ir para a rua, ter o contato com as pessoas, conquistar uma fonte, criar uma relação com ela. Aquele jornalista que, independentemente do veículo que ele esteja trabalhando, consegue ser considerado respeitado de confiança que não deturpa a informação, bem enfim um profissional. Tem diferentes perfis. Não basta só escrever, um repórter tem que saber escrever pelo menos corretamente, ter nexo, escrever com sentido. A pessoa não precisa ser brilhante e sim correta, simples, direta e objetiva a informação, e assim a história está contada. Tem gente que consegue ter um texto brilhante e ser um bom repórter, isso é o ideal.

Quando eu era mais jovem, tinha a tendência a ver sempre uma teoria da conspiração por trás de tudo. Eu já trabalhei nos maiores veículos do país: na Veja, na Isto é, Época, na Folha de São Paulo, no Estado de São Paulo. Eu senti muito pouco a pressão dos anunciantes, como repórter eu não sei se eu era inocente demais, as redações fluem naturalmente. É claro q tem os interesse, tem temas que são de interesse da empresa, o repórter tem como fazer isso normalmente.”

A imparcialidade

“A objetividade é um ideal, mas não é tão fácil de conseguir não. Na hora que pauta o repórter, já embuti um certo direcionamento, é um recorte, se é certo ou errado, se é bom ou ruim, depende de quem está lendo. A questão de ouvir todos os lados é fundamental, de preferência dando espaço igual para todos os lados. Eu acho que a imparcialidade é muito difícil, a gente não tem que perder de vista, tem que sempre buscar. Eu até acho que falta um pouco dessa subjetividade na descrição de uma cena. Por exemplo, um jornalista vai cobrir um tiroteio, pelo simples fato dele estar lá, ele é uma testemunha ocular dos fatos, como diria o Repórter Esso. A gente pode traduzir isso no texto que escreve. Podemos evitar os adjetivos, mas sim usar a descrição. Você está fazendo um relato do que você está vendo. O leitor tem vai confiar em você, você tem que se fazer confiar, não pode criar fatos, criar o que você não viu. Aí ficam aqueles textos frios, secos, sem vida. É quase a mesma coisa que ficar na redação, o repórter vai para a rua e às vezes ele não sabe se comportar e volta com uma matéria muito parecida com que ele teria feito dentro da redação pelo telefone. Isso falta um pouco para dar um molho, falta molho no jornalismo, as revistas fazem isso. Já fizeram mais, hoje tem muita opinião com informação, falta o molho, o sabor, transportar o leitor para o lugar onde o repórter estiver.”

O jovem jornalista


“Eu me preocupo muito com o jovem jornalista. Eu sou de uma geração e sinto falta daquele ímpeto jornalista de correr atrás de uma coisa nova, uma exclusiva, o furo de denúncia é fundamental, mas a cosia de revelar novos Brasis, personagens. O repórter hoje briga pouco por isso, se acomoda muito fácil. É todo muito fácil mas tudo muito igual, uniforme. Tem lugar para a boa reportagem, mas o repórter tem que ter apoio do veículo que ele trabalha. Os veículos estão com pouco dinheiro, investindo pouco em viagens o que dificulta a vida do repórter. Uma cidade como o Rio de Janeiro é um mundo, tem tudo. Há um certo comodismo, eu espero muito que essa nova geração venha menos preocupada com o glamour da profissão”.

Fabíola Ortiz