sexta-feira, 30 de novembro de 2007

Olha o PAC aí...

Hoje sexta feira, dia 30 de novembro, o presidente Lula veio ao Rio. Sua agenda está lotada, uma das atividades foi a visita às favelas do Cantagalo e Pavão-pavãozinho. São as primeiras favelas que o presidente visitou depois de ter sido eleito. A visita de Lula foi para marcar o lançamento das obras com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

As favelas de Ipanema vão ser as primeiras a darem início às obras de grande porte. Vão ser
obras de urbanização, sistema de água, esgoto, alargamento das ruas, praça e construção de áreas de lazer, além de melhoria na rede de iluminação. Cerca de 35 milhões de reais vão ser investidos nas obras dessas duas favelas e vai contar com a participação de mais de 1000 moradores que vão trabalhar nas obras.

Nessa semana, também foram concedidas as licenças ambientais que liberaram o início das obras do PAC também nas favelas da Rocinha, Manguinhos e do Alemão.

Na Rocinha que é considerada a maior favela da América Latina, o governo quer construir mais de 200 unidades habitacionais, creche, centro de saúde para desafogar o hospital Miguel Couto, na zona sul. A intervenção abrange 810 milhões de metros quadrados, e a estimativa é que 120 mil moradores da Rocinha vão ser mais beneficiados.

No complexo do Alemão, que fica na Penha, vai ser um milhão de metros quadrados que as obras vão intervir. Entre as obras de infraestrutural e habitacional, também está previsto a construção de um parque para lazer Além disso, a idéia de construir um teleférico para ligar a estação de trem de Bonsucesso a alguns pontos da favela.

E em Manguinhos, há também a idéia de criar o Parque Metropolitano com campos de futebol e quadras poliesportivas e quase 900 moradias.

O governo prevê que as obras estejam concluídas em dois anos. Nessas três obras, vão ser empregados mais de 910 milhões de reais.

Pois é, tudo isso o governo federal prevê realizar com os recursos do PAC. Parece até propaganda.... vamos ver no que isso vai dar.

O presidente de uma das 3 associações de moradores da Rocinha, o Carlos Costa, espera que os tão esperados investimentos se consolidem de verdade e não fiquem só no papel. Ele quer que sejam construídos espaços que não caracterizem a Rocinha como favela. O que falta, diz ele, são investimentos na qualificação profissional e escolas técnincas para os moradores.

"Qualquer intervenção que seja para melhorias da condição de vida das pessoas é bem-vinda. Mas não sei se a questão é de quantidade ou se é de qualidade. A quantidade hoje é razoável, mesmo que ainda não seja suficiente, mas não adianta criar uma nova intervenção se não criar condições de cuidado com aqueles espaços que já existem. Emergencial é infra-estrutura, saneamento básico, urbanização, além da criação de espaços de lazer de cultura para o desenvolvimento humano, escolas técnicas de boa qualidade com capacitação profissional. A gente quer viver num espaço considerado bairro, mas que ainda tem a característica de favela", disse.

O jeito é acompanhar as mudanças e esperar para daqui a dois anos avaliarmos o que de fato saiu do papel.

Fabíola Ortiz

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Série: entrevistas

Edna Dantas

Chefia o escritório da Radiobrás no Rio de Janeiro há 2 anos e meio.

Desafio

“O jornalista tem muitos desafios pela frente. Hoje tem uma figura nova que é o jornal online, muito rápido, muito ágil e que já causa um grande impacto na mídia impressa. Isso me preocupa por um lado. A questão da rapidez, eu tenho muito medo da informação errada, do prejuízo que ela causa muitas vezes. A gente não tem noção às vezes do quanto uma informação errada pode ser maléfica. Um instrumento que é de extrema utilidade, para o cidadão de uma maneira geral, quando ela é mal dada ou equivocada, traz um prejuízo enorme. Se não traz para a população em geral, mas pode trazer para um indivíduo. Isso é um custo muito alto. Eu reflito muito isso. A gente tem que ser rápido, é uma característica dessa profissão, obviamente que quem chega primeiro com a informação acaba se destacando do ponto de vista das empresas. Mas há uma série de riscos dentro disso.”

Jornalismo público

“A vantagem de se trabalhar numa empresa pública, talvez a gente não precise ter essa sede. Nós podemos ser rápidos, mas se tivermos que desacelerar para chegar com uma informação mais correta, podemos nos dar esse luxo. Não estamos competindo no mercado do ponto de vista comercial. A audiência é importância é obvio que é.

A gente tem muita coisa parecida, jornalismo é jornalismo em qualquer lugar, no caso da empresa pública, aumenta a responsabilidade. Do ponto de vista da empresa publica, quem está custeando isso é o publico de uma maneira geral, é a população brasileira, a nossa responsabilidade aumenta ainda mais. A gente não pode errar, a gente erra, mas não pode errar. A gente tem a obrigação de dar vozes ao maior número de pessoas. O jornalismo público tem muito esse papel de tentar se aprofundar mais nos assuntos. A gente está ainda muito distante nesse assunto. Tem espaço dentro das programações, a gente tem matéria de maior fôlego, a Rádio Nacional promove debates que a gente se aprofunda nos assuntos. Tem que trazer a discussão, temas que dizem mais respeito à vida das pessoas. A gente pode dar alguma outra abordagem. Isso tudo ainda é uma busca. A nossa estrutura é pequena, as emissoras públicas no Brasil não são grandes. Tinha uma cultura antiga, a gora está se conceituando mais o jornalismo público, como ele deve ser.

Com a tv pública, uma das funções é essa, abrir mais espaço para repercussões, mais reflexões. A gente tem que tentar trabalhar melhor esses formatos.

O rádio perdeu muito espaço para a tv, mas ele está se mostrando um veículo muito forte e que está permitindo aproveitar essas novas mídias, o rádio pela internet, por exemplo. O rádio tem longa vida, vai mudar porque a tecnologia está mudando. O advento do rádio digital vai permitir o volume de informação maior. O rádio ainda tem tudo para crescer e potencializar. O rádio é companheiro, continua sendo, está em qualquer lugar. Mas ele tem que se modernizar um pouco na linguagem, isso é um fator determinante para a sua sobrevivência, são adaptações. Nos formatos, a gente está precisando fazer mais radiodocumentário, sem ser chato, tentado usar de algumas ferramentas de sonoplastia, sonorização, trilhas. O som diz muito da realidade.”

O factual

“A gente tem que ter o factual, mas não pode perder de vista o processo, a contextualização, o acompanhamento do processo como fato, o fato tem um desenrolar. Muitas vezes, é comum a todos os veículos, fazer um acompanhamento das coisas. Às vezes dá um destaque no rádio, na tv, e esquece de acompanhar o que está acontecendo mais. Se o problema persiste. Esse é o ideal, mas há também toda uma questão de viabilidade econômica, os fatos vão se sobrepondo uns aos outros. A gente tem que na medida do possível buscar. Vai ter sempre aquele dia que não tem nada acontecendo, um vazio de notícias. Esses momentos seriam momentos para fazer algumas reflexões. Seria um momento do jornalismo ir a campo, deixar o telefone e o computador de lado.”

Papel do jornalismo

Edna concorda que o jornalismo tenha um papel de transformação social, “é um papel fundamental e cada dia, o papel é importante e a responsabilidade também. Quando a gente lança um fato e gera uma polêmica, por sermos formador de opinião, às vezes a gente esquece assuntos tão importantes que não estão na pauta dos jornais, meramente por uma polêmica, a polêmica pela polêmica. Mas acho que tem muita coisa boa sendo feita. Eu estou nesta profissão há quase 22 anos e não saberia fazer outra coisa. É claro que passo por crise como todo jornalista passa. Essa função social, às vezes quando você pára para fazer um balanço, o que será que eu consegui até hoje. Na verdade a imprensa tem conseguido muito. A gente vive um momento de um estado democrático onde se fala e se escreve tudo. Faz parte do processo de amadurecimento da imprensa. A gente passou muito tempo com a liberdade cerceada, eu acho que a gente se lambuzou muito no período da abertura, do governo Collor. Depois veio um vazio de notícias, sem muito critério. Tem a amadurecer muito ainda.”

O mercado

“Se eu fosse comprar com a minha época recém saída da faculdade, tem mais gente no mercado, uma competição maior, muitas universidades estão formando pessoas. Mas ainda continua a regra da qualidade, do empenho da dedicação. Por outro lado surgiram novos veículos e novas formas. Abriu-se caminho para aqueles jornalistas que querem trabalhar na assessoria de imprensa, na comunicação corporativa, tem também a internet que é um verdadeiro mundo a ser explorado e que pode gerar emprego, a questão do 3o setor, o rádio, as rádios comunitárias. Tem que ralar, tem que trabalhar muito. Tem duas questões: querer muito uma coisa e se dedicar. Essa profissão é uma profissão de dedicação. No início de carreira, o repórter tem que se mostrar aberto para trabalhar, e além disso tem que mostrar quem é bom. Tem gente, por exemplo, que nasceu para ser editor e pensar uma pauta, que nasceu para ser pauteiro, outro para ser repórter, ir para a rua, ter o contato com as pessoas, conquistar uma fonte, criar uma relação com ela. Aquele jornalista que, independentemente do veículo que ele esteja trabalhando, consegue ser considerado respeitado de confiança que não deturpa a informação, bem enfim um profissional. Tem diferentes perfis. Não basta só escrever, um repórter tem que saber escrever pelo menos corretamente, ter nexo, escrever com sentido. A pessoa não precisa ser brilhante e sim correta, simples, direta e objetiva a informação, e assim a história está contada. Tem gente que consegue ter um texto brilhante e ser um bom repórter, isso é o ideal.

Quando eu era mais jovem, tinha a tendência a ver sempre uma teoria da conspiração por trás de tudo. Eu já trabalhei nos maiores veículos do país: na Veja, na Isto é, Época, na Folha de São Paulo, no Estado de São Paulo. Eu senti muito pouco a pressão dos anunciantes, como repórter eu não sei se eu era inocente demais, as redações fluem naturalmente. É claro q tem os interesse, tem temas que são de interesse da empresa, o repórter tem como fazer isso normalmente.”

A imparcialidade

“A objetividade é um ideal, mas não é tão fácil de conseguir não. Na hora que pauta o repórter, já embuti um certo direcionamento, é um recorte, se é certo ou errado, se é bom ou ruim, depende de quem está lendo. A questão de ouvir todos os lados é fundamental, de preferência dando espaço igual para todos os lados. Eu acho que a imparcialidade é muito difícil, a gente não tem que perder de vista, tem que sempre buscar. Eu até acho que falta um pouco dessa subjetividade na descrição de uma cena. Por exemplo, um jornalista vai cobrir um tiroteio, pelo simples fato dele estar lá, ele é uma testemunha ocular dos fatos, como diria o Repórter Esso. A gente pode traduzir isso no texto que escreve. Podemos evitar os adjetivos, mas sim usar a descrição. Você está fazendo um relato do que você está vendo. O leitor tem vai confiar em você, você tem que se fazer confiar, não pode criar fatos, criar o que você não viu. Aí ficam aqueles textos frios, secos, sem vida. É quase a mesma coisa que ficar na redação, o repórter vai para a rua e às vezes ele não sabe se comportar e volta com uma matéria muito parecida com que ele teria feito dentro da redação pelo telefone. Isso falta um pouco para dar um molho, falta molho no jornalismo, as revistas fazem isso. Já fizeram mais, hoje tem muita opinião com informação, falta o molho, o sabor, transportar o leitor para o lugar onde o repórter estiver.”

O jovem jornalista


“Eu me preocupo muito com o jovem jornalista. Eu sou de uma geração e sinto falta daquele ímpeto jornalista de correr atrás de uma coisa nova, uma exclusiva, o furo de denúncia é fundamental, mas a cosia de revelar novos Brasis, personagens. O repórter hoje briga pouco por isso, se acomoda muito fácil. É todo muito fácil mas tudo muito igual, uniforme. Tem lugar para a boa reportagem, mas o repórter tem que ter apoio do veículo que ele trabalha. Os veículos estão com pouco dinheiro, investindo pouco em viagens o que dificulta a vida do repórter. Uma cidade como o Rio de Janeiro é um mundo, tem tudo. Há um certo comodismo, eu espero muito que essa nova geração venha menos preocupada com o glamour da profissão”.

Fabíola Ortiz

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

SÉRIE: entrevistas

Essa semana a pedido de um jornalista em Brasília, editor do site Inforel.org, escrevi sobre o jornalismo e a profissão de jornalista. Isso me deu uma idéia, resolvi entrevistar alguns jornalistas e um aspirante à carreira para saber um pouco mais do que eles pensavam sobre o próprio ofício.

Confesso que foi corrido, mas em poucos dias consegui entrevistar pessoalmente a diretora da Radiobrás aqui no Rio, Edna Dantas, um professor de jornalismo de uma universidade, Paulo Cezar Guimarães e um aluno que está prestes a se formar na Escola de Comunicação, Raphael Ferreira de 22 anos.

Além disso, consegui por email algumas opiniões do ex-chefe da agência internacional de notícias Efe aqui no Brasil, Eduardo Plastino. Tentei insistentemente entrar em contato com a jornalista uruguaia Beatriz Bissio do Cadernos do Terceiro Mundo, que me disse estar fora do Rio de Janeiro (pretendo ainda entrar em contato com ela, gostaria muito de saber a sua opinião sobre a profissão).

Para complementar a matéria, resgatei uma entrevista que o jornalista português ex-correspondente da RTP, Carlos Fino, deu para um grupo de estudantes em um curso em São Paulo, além de utilizar uma matéria feita por mim mesma com a diretora da Escola de Comunicação da UFRJ, Ivana Bentes, na época que eu estagiava na Agência de Notícias da própria universidade para o boletim online Olhar Virtual.

Ao escrever a matéria, até por questão de espaço, tive que reduzir e deixar de lado muitas questões abordadas pelos entrevistados.

Com toda essa introdução, resolvi publicar aos poucos as entrevistas que eu consegui fazer tentando aproveitar todos as questões e críticas apontadas pelos entrevistados.

Para abrir a "série", antes mesmo de colocar a primeira entrevista, pensei em publicar um trabalho que fiz para a faculdade em 2005 para a disciplina Técnica de Reportagem. O desafio era escrever o perfil de um jornalista. Escolhi escrever sobre a jornalista que havia pouco conhecera, Carla Mendes, correspondente internacional para a agência de notícias portuguesa, LUSA.

Acho que vale colocar aqui.

Perfil de uma jornalista

Niterói, 10.30hs – hora marcada para a entrevista. Carla Mendes, jornalista formada na Universidade Federal de Minas Gerais, final dos anos 60 e início dos anos 70, já estava à espera no local combinado, na piscina de um prédio residencial no bairro de Ingá.

E lá estava realizando práticas de meditação e lium kung. Ao fundo, uma musiquinha oriental, bem relaxante. “Já estou quase terminando”, corta o silêncio e continua com seus movimentos leves por mais vinte minutos.

Mora em Brasília e trabalha como correspondente para a Agência Internacional de Notícias Portuguesa, LUSA, há mais de cinco anos. Só no Brasil inteiro são dois os jornalistas incumbidos de cobrir para a LUSA, ela é um deles.

Vestindo um short da cor preta e deixando à mostra a parte de cima do biquini da mesma cor, senta-se na mesa ao lado da piscina. “Vamos começar” diz, aprontando-se para a conversa. Em um domingo de sol como este, não esquece o protetor solar, os óculos escuros e o boné. Anda a tiracolo com uma bolsinha de mão contendo um celular, um livro e um caderninho de anotações, imprescindível mesmo para as horas de descanso.

“Na minha época de faculdade tive muitas dúvidas entre Comunicação e Psicologia, cheguei até a pedir transferência de curso, mas meus professores não deixaram”. Tendo saído de casa aos dezoito anos, decidiu ser independente. “Fui morar sozinha, eu queria batalhar a minha vida, não depender de ninguém”.

E foi assim que Carla viveu mesmo antes de formada. Autonomia era seu estilo de vida e independência seu principal objetivo. Estagiou na Associação Brasileira de Odontologia (ABO) e na TV Alterosa (da rede do SBT) como produtora de um programa de entrevista.

“Logo quando eu me formei, comecei a fazer o meu currículo. Não tinha nada nele”, conta que saiu entregando o currículo para os diretores de TV. “Eu era muito convicta na minha profissão, eu sabia que era isso mesmo que eu queria”. Num momento retrospectivo disse: “um grande amigo meu hoje em dia, que já foi meu chefe na época de recém-formada até chegou a dizer ‘nossa, você não tinha nada no seu currículo, mas você falava com tanta convicção que até eu acreditava’”.

Trabalhando para a TV Manchete, um episódio marcante em sua vida foi durante a cobertura das eleições no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) em Minas Gerais. “Não sei como foi exatamente, mas acabei entrando numa salinha onde a Globo tinha armado todo um esquema para a contagem de votos”. Toda a informação de lá saia diretamente para a emissora. “Eu tinha um radinho de pilha só para ouvir e acabei entrando na salinha e comecei a ouvir toda a conversa, e o que eles falavam em voz alta. Mandei tudo para a Manchete antes mesmo da Globo lançar a informação.Você não acredita, eu ia para o banheiro, ficava escondida e contava tudo por telefone. Quando o diretor da Globo descobriu, ficou uma fera: ‘quem é que está boicotando as minhas informações?’. No futuro, anos depois, Carla trabalharia com ele na Globo. “O pior que ele me reconheceu... nem eu lembrava mais daquele episódio... ‘como é que eu ia me esquecer de você com aquele radinho de pilha’, ele brincava”.

Esse evento lhe rendeu a contratação como produtora na TV Manchete. Durante três meses Carla trabalhou na produção e passou mais dois anos na reportagem. “A minha área sempre foi mais televisão”.

“Na Globo foi uma passagem rápida, fui convidada para substituir a repórter do Jornal Nacional”, conta que foi no ano de 1985, “nessa época eu queria mesmo era ir para a Europa”.

Sua aventura na Europa começou em 1986 em Portugal, 88 na Itália e 89 na Alemanha. Saiu do Brasil como correspondente da Rádio Alvorada e penou para conseguir algum trabalho na imprensa européia. “Eu tinha uma cara-de-pau como todo jornalista, ‘Boa tarde, meu nome é Carla Mendes...’. Eu ia na cara e na coragem. Fui mandando matérias com o meu currículo para vários jornais da Europa.”

Em Portugal trabalhou na área de Assessoria de Imprensa para uma agência de publicidade. A Itália foi um breve capítulo em sua trajetória, “prefiro não comentar, foi uma experiência pessoal muito ruim na minha vida”. Carla ajeita-se na cadeira e respira fundo.

Seguiu para a Alemanha com o namorado alemão também jornalista. Ela o conhecera em Portugal. “Eu não sabia nada da Alemanha, mas não agüentava mais Portugal, eu queria desafio”.

“Em 1989 peguei a queda do Muro de Berlim”. A sua chegada na Alemanha foi um tanto quanto conturbada. Roubaram todas as suas coisas em Hamburgo. “Perdi tudo, todo o meu passado, meus livros, minha história, todas as minhas matérias publicadas, os contatos e referências que eu tinha do mundo inteiro. Foi horrível”, lamentou-se.

Foi um momento de profunda solidão, um mergulho em si mesma. “Eu me descobri lá. Antes eu era uma Carla, depois da Alemanha eu virei outra. Foi muita dor, muito sofrimento, era o fundo do poço, ou você conseguia sobreviver e se fortalecer ou você afundava”.

Carla conta que depois de haver chorado todas as suas mágoas, “peguei uma garrafa de champagne, fui para o Brandenburg Tor comemorar o reveillon e celebrar a queda do muro”. Para ela, uma experiência inesquecível. “Cobri toda a queda do Muro e o processo de reunificação política da Alemanha para a imprensa portuguesa O Jornal”.

Foi um marco histórico em sua vida. “Era uma multidão, podia ter acontecido um grande massacre. Era gente querendo atravessar o muro de um lado para o outro: gente de Berlim Ocidental querendo ver como era o lado Oriental e vice e versa. Nós vimos a bandeira da RDA sendo arriada, um momento muito emocionante”.

Para ela foram experiências inéditas, “é muito interessante conhecer o outro lado, como se estivéssemos vendo uma ‘carroça’ o atrasado em relação ao supérfluo. O capitalismo foi um movimento de invasão tão grande, que eu questiono isso: foi quase um estupro”.

Diz que o que lhe marcou na lembrança foi conhecer um pouco a história do muro, o reencontro das famílias, muitas mortes, pessoas tomando conhecimento de familiares mortos, o choque cultural. “O muro caiu, mas até hoje existe um muro invisível”.

Sua estadia na Alemanha terminou em 1994, “depois o país já estava reunificado, e eu não tinha mais nada para fazer lá”.

Voltou para o Brasil e para a TV Manchete como editora. Suas aventuras não pararam por aí: trabalhou durante um ano na TV Assembléia na parte de edição. “Era muito trabalho, muito estresse e não havia condições. A produção era tão ruim que acabei montando uma nova produção. Eu fazia de tudo lá, fui âncora, editora, fazia edição final, dirigia debates, mil coisas”.

Depois transferiu-se para o Canal 23, um canal da TV a cabo local, como chefia de redação. “Não era fácil, tinha muita gente nova, e para coordenar todo mundo era uma loucura”.

Fez até campanha política para um candidato do PSB no estado de Minas. “Foi uma experiência diferente. Era tanto programa que não tinha ninguém para fechar, a estrutura era muito pequena para a carga de trabalho”. Carla pode conhecer mais as entranhas da política, os jogos de chantagens, “a sujeirada toda”.

Está na LUSA desde 2000. “Antes a LUSA tinha uma estrutura maior. A agência tinha um projeto muito interessante para o Brasil, mas não conseguiu manter o projeto inicial, "megalômano". A LUSA acabou reduzir a equipe toda limitando-se apenas a dois jornalistas, um em São Paulo e outro em Brasília, cada um trabalha em casa”.

Carla fala sobre a carreira de jornalismo: “é uma profissão muito difícil, em geral mal-remunerada. Mas é profundamente desafiadora. Você abre a cabeça e aprende a lidar com diversas realidades. Um dia você pode estar conversando com uma autoridade, um prefeito, e no dia seguinte, com um morador sem-teto da mesma maneira de agir e falar. É uma carreira difícil, é muito estresse... como eu batalhei...”.

Finaliza o encontro encorajando aos estudantes que pretendem seguir a carreira de jornalista: “Dou muito valor àqueles jornalistas recém formados ou estagiários que vêm se apresentar com o currículo na mão, sem indicação de ninguém, na cara e na coragem. Já tive que selecionar currículos e sempre deixei de lado aqueles que tinham indicação de deputado, autoridades... Porque foi assim que eu fiz, eu não conhecia ninguém, e foi desse jeito que eu batalhei”.



Fabíola Ortiz, 2005.

A pauta do dia: aquecimento/esquecimento global e degradação ambiental

E com vocês... mais um pouco de meio ambiente: A sustentabilidade no jornalismo


Essa semana na disciplina de Jornalismo de Políticas Públicas na Escola de Comunicação da UFRJ que é realizado em parceria com a ANDI (Agência de Notícias dos Direitos da Infância), o convidado para falar foi o jornalista André Trigueiro para tratar sobre a temática do jornalismo ambiental e a sustentabilidade.

Atualmente André Trigueiro apresenta o Jornal das 10 na Globonews, criou o programa semanal "Cidades e Soluções", e aos sábados apresenta o programa na rádio CBN "Mundo Sustentável" - também título de seu livro lançado em 2005.

A primeira crítica que Trigueiro fez foi em relação a criação de uma editoria especial para Jornalismo Ambiental. Nesse sentido, Trigueiro é incisivo: seria muito pobre fazer uma segmentação da realidade.

Para ele, todas as editorias deveriam conter a sustentabildade como tema que perpassa as pautas e os assuntos abordados. Desde os impactos econômicos sobre o desenvolvimentos, ou a questão política do Protocolo de Kyoto que prevê a redução de emissões de CO2 em 5,2%, em relação aos níveis de 1990 para o período que vai 2008 a 2012. Até o momento, 23 países, incluindo Bolívia, Equador, El Salvador e Nicarágua, já ratificaram o protocolo, e outros 84 países, entre eles os Estados Unidos, somente o assinaram.

Os assuntos ambientais estão presentes em todas as editorias. Trigueiro estabelece que em vez de jornalistas ambientais , é mais interessante e imprescindível formar jornalistas que tenham uma visão mais sistêmica sobre omundo.

Ele não descarta o lead como uma ferramenta necessária para promover a tão buscada objetividade no jornalismo. Mas para o jornalista, não se pode perder a perspectiva de enxergar outros aspectos também relevantes de uma pauta. Em parte, até concordo com ele. O "lide" não precisa ser encarado para limitar, restringir e enquadrar a matéria. Muita coisa diferente pode ser feita, e o lide pode até contribuir na estruturação da matéria.

O jornalismo é imediatista, está sempre atrelado à velocidade e ao tempo. Trigueiro reconhece que pela questão da rapidez de dar a notícia, "às vezes a gente não tem tempo de enxergar sistemicamente".

Algo interessante em sua fala, foi que ser jornalista no Brasil é completamente diferente do que ser em qualquer outro lugar do mundo. O Brasil é o país com a maior reserva de água doce do mundo, tem a maior floresta tropical no planeta, preserva o maior patrimônio de biodiversidade, além de ter a maior quantidade de solo fértil do mundo (sem nem levar em conta as áreas protegidas).

Para ele, ser jornalista interessado no meio ambiente no Brasil significa saber resgatar o valor desse tesouro de forma sustentável. Não só isso, entre outras críticas está a carência de discussão na mídia entre os conceitos de crescimento e desenvolvimento, que muitas vezes são empregados na imprensa sem critério e distinção. A sustentabilidade deve ser uma discussão que permeia o debate do desenvolvimento e crescimento do país.

Trigueiro faz uma rápida distinção: o crescimento engloba números, dados, estatísticas (por exemplo, o PIB de um país que não necessariamente expresa de forma qualitativa a situação). Já o desenvolvimento é a qulaidade do número, a compreensão nos seus mais variados aspectos e não apenas econômico.

Vale aqui caracterizar a forma não sustentável de se utilizar dos recursos mundiais do planeta Terra: retirar algo que não seja reposto a tempo. A forma nao sustentável de exploração dos recursos naturais se dá quando ela é superior à capacidade de recomposição, isto é, a capacidade de suporte e de resiliência (recuperação).

Trigueiro apresenta alguns dados do Banco Mundial em que as 25 cidades mais poluídas do mundo, mais de 10 delas são chinesas, entre elas uma é Pequim - a mesma cidade que vai sediar as Olimpíadas de 2008. No caso da China, a cada 2 dias acontece um desastre ambiental - entre chuvas ácidas e a redução do nível do lençol freático que já diminuiu cerca de 60 metros.

No auge de sua discussão, Trigueiro solta uma pérola: "o jornalismo ambiental é subversivo e incomoda os interesses econômicos de muita gente". É verdade.

Aproximando à realidade brasileira: a recente descoberta monumental de reserva de petróleo. Em tempos de aquecimento global, a queima de combustível fóssil vai na contramão de um esforço global na diminuição dos índices de emissão de CO2. O custo ambiental do petróleo é muito grande.

O jornalista apresenta uma tendência futura (mas bem próxima) de tipificar o preço do petróleo de acordo com o custo ambiental. Isto é, os preços de cada produto ou serviço vão variar de acordo com o desgaste ambiental. O consumidor vai passar a ter a necessidade de ser informado quais produtos gastam mais CO2 para que o próprio consumidor/cidadão possa fazer a sua escolha. Ou seja, o preço vai internalizar o custo que o Estado e a sociedade vão ter para produzir certos produtos.

"O que será o mundo daqui a 8 anos?" - se pergunta Trigueiro.

Atualmente, a Petrobrás investe cerca de 1,5% em energia renováveis como - solar, eólica, biomassa, biodiesel, álcool - o que ele considera muito pouco. A empresa deve ter um comprometimento em investir mais em fontes de energia renovável.

E quanto aos jornalistas, Trigueiro também não deixa passar: "somos analfabetos ambientais, ainda não estamos preparados para investigar aquilo que não está no realease". Para ele, é imprescindível questionar e duvidar, o que muitos jornalistas não fazem e aceitam o que está nas propostas de pauta de assessorias de imprensa. É preciso estrapolar o limite da pauta oferecido pelo editor.

Não basta só informar: é preciso que a informação remeta a uma nova atitude. Não vale apenas compartilhar informação, tem que transformar. Trigueiro destaca a urgência de transformação: "e não basta mudar, tem que mudar logo".

É uma questão de consciência: não pela disponibilidade de recursos e sim quanto à gestão desses recursos. Esse é um momento único na humanidade. O jornalista alerta para a emergência da crise ambiental sem precedência. Segundo dados da WWF ( World Wildlife Fund/Fundo Mundial para a Natureza), 20% da humanidade utiliza 80% dos recursos. O planeta Terra está operando em um déficit de 25% de sua capacidade de suporte.

"Nós não somos sustentáveis, o tempo urge, nós precisamos nos reeducar", afirma Trigueiro. Os ecossitemas naturais do planeta não são inesgotáveis, e uma vez atingido, afetado, ele não consegue se restabelecer e voltar ao normal.

"O aquecimento global é um tema complicado de tratar na imprensa. Não importa o que fazemos hoje só vai se percebido em não menos de 100 anos, o resultado será visto por outras pessoas", diz.

Para tratar o tema na imprensa, Trigueiro dá a dica: é preciso utilizar o bom senso e não ser alarmista e indicar possibilidades, formas de reverter o processo, e a mudança deve ser feita já.

"É preciso ter calibragem na hora de tratar o assunto, isso não é pessimismo, é realismo. Vivemos numa cidade ignorando o impacto causado pleo nosso estilo de vida", ele defende um exercício e uma reeducação para a responsabilidade cidadã, principalmente no que se refere ao consumismo - ostentar onde há escassez, a maioria das pessoas não têm nem o básico para sobrevier. Trigueiro é crítico feroz e contrário ao consumismo compulsivo.

Fabíola Ortiz


Veja mais alguns sites:

http://www.wwf.org.br/index.cfm

http://www.mundosustentavel.com.br/

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

O meio ambiente.... e eu com isso?!

A questão ambiental e todos os aspectos que envolvem a preservação do meio ambiente, a compreensão do desenvolvimento humano associado à ecologia, a noção de que o crescimento econômico também deve estar intimamente ligado a sustentabilidade ecológica... pois é... tudo isso já não é mais coisa do futuro para as próximas gerações pensarem nisso .

Aquela velha idéia de que não devemos nos "pré-ocupar" de coisas que supostamente deveriamos deixar mais para frente, ou apenas nos ocuparmos de aproveitar, extrair e explorar toda a capacidade que o meio ambiente pode nos prover (principalmente quando falamos em lucratividade), já não existe mais.

A preocupação é real e é agora, não dá para empurrar com a barriga. Hoje o meio ambiente é prioridade se quisermos pensar em desenvolvimento sócio-político-econômico e cultural também.

Uma iniciativa interessante de alunos do Programa de Ensino Tutorial da Escola de Comunicação da UFRJ (PET/ECO) é a Semana Nacional de Comunicação Ambiental*. Mas o que a comunicação tem a ver com o meio ambiente?

Pois é, tem tudo a ver sim.
Se pensarmos em como dar maior visibilidade à questão ambiental em seus mais variados aspectos, já estamos pensando em comunicação.
Se informarmos nos noticiários, pura e simplesmente, um desastre ecológico e um vazamento de óleo, ou queimadas, ou deslizamento, ou enchentes,...., já estamos falando em comunicação.

Se fizermos campanhas de conscientização sobre a coleta seletiva de lixo ou apenas não jogar lixo nas ruas, também estamos falando em comunicação.

Não há como fugir, uma vez que estamos inseridos em um mundo globalizado que caracteriza-se pela socidade conectada em rede e em fluxos de informação. E informação é comunicação. A sociedade informatizada depende de meios de comunicação e redes que permitam tais trocas de informação.

Hoje o Secretário Estadual de Meio Ambiente Carlos Minc, também professor da UFRJ, como convidado para ab
rir junto com outros palestrantes a Semana, defendeu a necessidade de incorporar uma cultura ambiental entre os jovens, que para ele, seriam os "futuros gestores nas tomadas de decisão".

“Hoje a sociedade não admite mais que o custo do desenvolvimento seja destruir as florestas, contaminar os rios, aumentar as emissões de gás aquecendo o clima e derretendo a geleiras. Finalmente caiu a ficha ambiental, nós queremos um desenvolvimento de qualidade”, destacou.

Quando tive a oportunidade de falar rapidamente com uma professora da ECO, quem estava mediando a mesa de debate do primeiro dia do evento, a Cristina Rego Monteiro, também jornalista, ela disse algo bem interessante:

“É fundamental promover um evento como esse numa universidade, nós precisamos ter uma perspectiva de mudança de paradigma na cobertura, não adianta trabalhar com notícias de escândalo e denúncias. A gente tem que ter uma visão quase pedagógica, didática e de conscientização, um jornalismo educativo conscientizador”.

Ela defende
uma mudança na forma de tratar o tema do meio ambiente nos veículos de comunicação. Para ela é preciso ter uma visão integrada da ecologia, pois a questão ambiental deve estar presente em todos os profissionais que trabalham com a comunicação.

Algo que o
aluno de graduação Gustavo Barreto e também bolsista do PET, um dos coordenadores do evento, explica que o objetivo é integrar a perspectiva humana ao meio ambiente e formar novas gerações.

“O que inova nesse evento é o foco na comunicação voltado para a educação ambiental, a idéia é formar novas gerações e não focar apenas nos desastres, na lógica das tragédias, a idéia é ter um olhar propositivo sobre o tema”.

Pois é, concordo.

Talvez hoje a mídia esteja muito voltada a cobrir desastres, é um ciclo vicioso de tragédias, e nunca busca a compreensão da raiz do problema, são apenas causas pontuais e isoladas.


*A Semana de Comunicação Ambiental vai até o dia 8 de novembro e vai discutir questões da atualidade sobre gestão ambiental, a comunicação e a sociedade civil. Vai contar com a presença de ativistas, pesquisadores e profissionais do meio.

Fabíola Ortiz


O site do evento:

http://www.eco.ufrj.br/semanaambiental/


Sites interessantes sobre meio ambiente:

http://www.ambientebrasil.com.br/


http://bioneconomy.blogspot.com/

http://www.oeco.com.br/

Fotos
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Região serrana - RJ










Ilha da Marambaia - RJ









Cachoeira da Formiga/Jalapão - TO









Jalapão - TO










Fervedouro/Jalapão - TO










Jalapão - TO