quinta-feira, 3 de abril de 2008

Canção do festival da TV Cultura de 2005 quando chegou às finais. É um retrato social do Brasil. Foi criada e apresentada antes da tragédia do menino João Hélio, antes da discussão no Congresso sobre maioridade penal e, é também anterior ao "Cansei"!

Veja o link:

http://mais.uol.com.br/view/299yq0eahs14/classe-media-essa-musica-nao-toca-no-radio--040262C4C11326

Jornalismo de Políticas Públicas Sociais

Para Leonardo Mello todo povo é tão ruim quanto a desigualdade que ele tolera, pois isto é submissão

“Todo povo é tão ruim quanto a desigualdade que ele tolera”, afirmou o sociólogo Leonardo Mello –especialista em orçamento público e indicadores sociais, que se despediu nesta segunda do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas-Ibase, onde atuou desde 1991.

“O elemento chave é a desigualdade social, eu sou a favor da desigualdade, sou e sempre fui a favor, e tenho a impressão de que todo mundo é. A dificuldade é de entendermos de que desigualdade estamos falando e de que tipo”, ressaltou o sociólogo em sua palestra nesta segunda-feira, dia 31, ao abordar o tema A desigualdade social no Brasil e os processos de formulação das políticas públicas sociais compensatórias, na Disciplina e Curso de Extensão Jornalismo de Políticas Públicas Sociais, uma realização do Programa Acadêmico do Núcleo de Estudos Transdisciplinares de Comunicação e Consciência-NETCCON da Universidade Federal do Rio de Janeiro-UFRJ, em parceria com a Agência de Notícias dos Direitos da Infância-ANDI.

Leonardo Mello parte do princípio de que a desigualdade no Brasil não permite que as pessoas vivam plenamente. Para ele, são fatores muito difíceis de medir a desigualdade e é preciso estar atento à mudança de paradigma entre a desigualdade baseada em um juízo de valor e uma atenção diferenciada por parte do Estado.

“O que me incomoda é a ausência dos direitos. A nossa desigualdade não é da tolerância, é da submissão e não do respeito. Este debate sobre a percepção da desigualdade e do que foge à norma, é um objeto de juízo de valor”, discute. E ainda acrescenta, “junto a isso, tem a nossa especificidade, pois a persistência e a brutalidade da desigualdade no Brasil atingem um grande número de pessoas que não têm direito a nada”.

O especialista se questiona: “Conseguimos perceber as desigualdades? Talvez a gente não se sinta igual o tempo todo”. Ele explica que ao longo da vida nós aprendemos a visualizar as desigualdades, porém “algumas nós toleramos e outras nós reprimimos”, e citou exemplos como a desigualdade de sexo entre homens e mulheres e de faixa etária.

E insiste: “Qual desigualdade é tolerável? Eu tenho a impressão de que durante a educação na nossa infância, nós fomos treinados a nos afastarmos das pessoas que são socialmente inferiores a nós e a nos aproximar a quem é socialmente superior”, isto de acordo com o sociólogo é onde ocorre a imposição de juízos de valor sobre a constatação da desigualdade. “Se alguém é assaltado no Leblon é notícia de capa no jornal, mas quem é assaltado no subúrbio não é notícia porque isso é normal”.

Leonardo Mello reconhece que há racismo no Brasil, “mas como é possível haver racismo num lugar onde supostamente não há racistas? Procure um no Brasil, é difícil. O ‘você sabe com que está falando’ é outra forma de interagir com a desigualdade”. Ele citou ainda a questão da diferença de renda no debate sobre a pobreza. Um dos indicadores para falar de desigualdade é a renda, tenta-se medir a desigualdade calculando o quanto ganham os 10% que recebem mais, e os 40% mais pobres – esta medida seria universal e comparável a outras sociedades capitalistas. “O Brasil é o campeão das desigualdades, mas nós temos instituições que medem com indicadores, avaliam e comparam os resultados com outros países. Certamente, há países africanos com mais desigualdade que o Brasil, mas não há ninguém para medir”, disse.

O sociólogo trouxe também informações sobre estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada-IPEA que mostram que 30% da população brasileira é tida como pobre. Como explicar a persistência de dados tão ruins da nossa realidade social? E ainda critica, “a desigualdade social no Brasil se manifesta em muitas esferas ao mesmo tempo, no acesso ao saneamento, no nível de escolaridade e na qualidade do ensino. Isso nos leva a máxima de que no Brasil não basta ser pobre, mas tem que sofrer. Em todas as esferas de nossa vida é tudo um pouco piorado quando se é mais pobre, ou quando se é mais desigual”.

Os dados sobre desigualdades são abundantes, segundo Mello, “o meu ponto exato é a percepção da desigualdade que é aceitável, nós não temos interesse na realidade social”. Para ele, as políticas públicas são processos, há pouco tempo algumas agendas políticas eram menosprezadas a exemplo da população negra, do portador de deficiência, das questões que envolvem o meio-ambiente.

“Falta um meio-termo quando a gente discute a desigualdade, ou encara-se todo mundo igual, ou transforma-se tudo em gueto”. Ele se pergunta: “que dispositivos nos levam a nos interessarmos pelas desigualdades e pela formulação de políticas públicas compensatórias? Na hora que a sociedade desperta para o tema, é a hora que as políticas públicas são formuladas. Nós temos a percepção de quando a gente discute desigualdade, estamos discutindo pessoas que não são normais. Gostamos de nos ver enquanto norma, e reprimir os que têm um comportamento desviante”.

Mas para o pesquisador, o perigoso é achar que o outro está sempre à margem. “A nossa desigualdade não é da tolerância e do respeito aos direitos, é da submissão. A questão é olhar o outro como se olhássemos a nós mesmos”, ressaltou.

A democracia, considerou Leonardo Mello, é fruto do diálogo e não da força, e o diálogo é baseado em argumentos. “O que importa para mim é a formação deste olhar, a igualdade e o respeito às diferenças”. E para o jornalista é importante ter argumentos e a percepção dos fatos, “aonde tem um fato relevante para ser apurado, aonde você toca as pessoas, isto é a percepção pública”. Para Mello, o essencial é apurar bem, contextualizar e produzir argumentos.

Uma forma de falar em políticas públicas é discutir orçamento público. Este é o tema da palestra que Leonardo Mello dará na Disciplina e Curso de Extensão de Jornalismo de Políticas Públicas Sociais do NETCCON e da ANDI, em Orçamento nacional: As possibilidades de intervenção e orientação para o social, no dia 28 de abril no auditório da Central de Produção Multimídia da Escola de Comunicação da UFRJ.

O orçamento público, adiantou o sociólogo, é uma lei autorizativa, isto é, “ela autoriza a pôr em prática um projeto e não obriga, como seria no caso de uma lei mandatória. Nos EUA, por exemplo, o orçamento público é mandatório, lá você tem que fazer”, explicou. O orçamento público ainda é uma política pré-pública, e a sociedade não tem sensibilidade para participar do processo de formulação de políticas públicas. Mello citou o sociólogo e também ativista dos direitos humanos Betinho, fundador do Ibase, ao fazer a provocação para o público de 80 pessoas presentes em sua palestra, que “se a educação é prioridade e não gastarmos na educação, isso é demagogia”.

Para Leonardo, o mercado tem como função promover a desigualdade pois é movido pela lógica da produção do lucro. “Mas essa não deveria ser a função do Estado. O Estado não pode promover a desigualdade, ele foi apropriado por setores que promovem a desigualdade no setor público. Aí não funciona mesmo. Existem exemplos de desigualdades de baixo de nossos narizes, como o grande número de assassinatos em favelas, as desigualdades no acesso à cultura. O que me incomoda é a apropriação de dinheiro público”, considerou.

Por que então pensar em políticas públicas compensatórias? Mello responde: “primeiro pelo grau de desigualdade que a nossa sociedade vive, não é razoável nem em renda, nem em salário ou em educação. Se as empresas promovem as desigualdades, está tudo bem. O Estado é que não pode fazer isso. Quando ele não coloca o dinheiro no lugar mais adequado e pensa qual política é mais ou menos compensatória. O problema da questão da desigualdade é que não há compensação. A política compensatória é função precípua do Estado. O conceito de público é para todo mundo, universal, mas não há dinheiro para fazer para todos, então, política pública é tudo que atende a todos”.

Para Mello, a política compensatória está associada a políticas sociais e “a idéia de compensatória está em recompor a noção de equilíbrio e de direito”. E afirma que o essencial é sermos parte da equação do problema e da solução. “Todos nós, em diferentes etapas da vida, temos uma certa carência. O Estado não tem dinheiro para dar tudo o que a gente quer. A sociedade que temos é uma média da sociedade que todos nós queremos. E a política pública, portanto, é fruto dos nossos desejos que são compartilhados socialmente”.

Mestrando em Estatística pela Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence), com especialização na Lyndon Johnson School of Public Affairs da Universidade do Texas em Austin, e graduação em sociologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Leonardo Mello está desde 1991 no Ibase e, atualmente, trabalha na área de metodologia de pesquisas e indicadores.

Esta disciplina, oferecida aos alunos da Universidade e à Sociedade em geral, é resultado do convênio entre o Programa Acadêmico do Núcleo de Estudos Transdisciplinares de Comunicação e Consciência-NETCCON/ECO/UFRJ, coordenado pelo Prof. Evandro Vieira Ouriques, e a Agência de Notícias dos Direitos da Infância-ANDI.

O Programa Acadêmico do NETCCON dedica-se às relações entre a mídia, a ética e a não-violência (no sentido de luta sem violência), tendo em vista o vigor da experiência de comunicação, da auto-construção da cidadania e da responsabilidade socioambiental na Mídia, na Política e nas organizações. Neste sentido o NETCCON criou e vem oferecendo há três anos consecutivos também a disciplina Construção de Estados Mentais Não-violentos na Mídia.

O Programa Acadêmico do NETCCON visa: Prover a Sociedade, sob a perspectiva das Ciências da Comunicação, com estudos e metodologias de prevenção e superação da violência, que contribuam para o salto de qualidade: (1) na cobertura midiática das Políticas Sociais e em sua gestão pública; (2) nas políticas e estratégias de Comunicação para a Responsabilidade Socioambiental; e (3) no padrão ético ("voz própria" e "vínculo") do trabalho de presença e colaboração nas Redes e Organizações. O NETCCON criou e oferece também a disciplina Comunicação, Construção de Estados Mentais e Não-violência, e está criando a disciplina Comunicação e Responsabilidade Socioambiental. Maiores informações sobre o NETCCON podem ser obtidas através de evouriques@terra.com.br.

Conheça mais sobre a disciplina aqui:
http://informacao.andi.org.br:8080/relAcademicas/site/visualizarConteudo.do?metodo=visualizarUniversidade&codigo=6

Palestras a serem realizadas em 2008/1:

Semana 5 (07/04):
Lições Africanas para a Igualdade na Diversidade Humana: a questão da não-violência.
Palestrantes: Mãe Beata de Iemanjá, Conceição Evaristo e Prof Evandro Vieira Ouriques.

Semana 6 (14/04): O Paradigma do Desenvolvimento Humano como orientador da cobertura.
Palestrante: Flavia Oliveira (O Globo)

Semana 7 (28/04): Orçamento nacional: As possibilidades de intervenção e orientação para o social.
Palestrante: Leonardo Mello (IBASE)

Semana 8 (05/05): O desafio de aumentar a presença das políticas públicas na grande imprensa.
Palestrante: Bia Barbosa (Intervozes)

Semana 9 (12/05): A cobertura das políticas públicas na área da Educação no Brasil.
Palestrante: Antônio Góis (Folha de S. Paulo)

Semana 10 (19/05): Cobertura de qualidade em meio à violência estrutural: A força política da não-violência e a responsabilidade dos atores sociais e dos jornalistas.
Palestrante: Prof. Evandro Vieira Ouriques (NETCCON.ECO.UFRJ, NEF.PUC.SP)

Semana 11 (26/05): A Questão das Políticas Públicas Sociais e a Mídia Contra-hegemônica.
Palestrante: Paulo Lima (Viração)

Semana 12 (02/06): A Comunicação criada pela Periferia no Rio de Janeiro.
Palestrante: Prof. Augusto Gazir (Observatório de Favelas e ECO.UFRJ)

Semana 13 (09/06): O paradigma dos Direitos da Criança e do Adolescente: A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança e o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Palestrante: Wanderlino Nogueira Neto (ABONG)

Semana 14 (16/06): A Mídia e a Questão das Políticas Públicas Sociais no Brasil.
Palestrante: Guilherme Canela (ANDI)

Semana 15 (23/06): O Paradigma da Diversidade Cultural.
Palestrante:
Profa. Sílvia Ramos (CESEC)

Semana 16 (30/06): Jornalismo prospectivo e o futuro das políticas públicas sociais como pauta.
Palestrante: Rosa Alegria (NEF-PUC/SP, NETCCON.ECO.UFRJ, Millennium/UNU)

Palestras já realizadas em 2008/1:

Semana 1 (10/03): Interesse, Poder e Dádiva: a questão do domínio dos estados mentais e da generosidade na positivização da rede de comunicadores-cidadãos.
Palestrante: Prof. Evandro Vieira Ouriques (NETCCON.ECO.UFRJ, NEF.PUC.SP)

Semana 2 (17/03): A Violência que Acusa a Violência: a degradação de Si e do Outro através da Mídia.
Palestrante: Prof. Michel Misse (NECVU.IFCS.UFRJ)

Semana 3 (24/03): A Abordagem de Temas Sociais junto a Públicos Não-iniciados: o Caso dos Jornais de Grande Circulação e Distribuição Gratuita.
Palestrante: Prof. José Coelho Sobrinho
(USP)

Fabíola Ortiz