Por Fabíola Ortiz
RIO DE
JANEIRO, 15 jun (TerraViva) – É possível realizar uma reforma agrária
sustentável com desmatamento zero na Amazônia? Este é o desafio que
o governo brasileiro tem se lançado nos últimos dois anos.
Atualmente, só na Amazônia
brasileira, vivem 580 mil famílias assentadas em terras de reforma agrária em
quatro mil projetos de assentamento do Instituto Nacional
de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
O presidente do INCRA, Celso Lacerda, garantiu à IPS ser “plenamente possível”
conciliar os interesses e garantir a produção de alimentos em assentamentos de
reforma agrária sem desmatar.
Em um evento promovido pelo
Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) no Side Events durante a
Rio+20, dedicado às atividades da sociedade civil – os chamados ‘Major Groups’
–, ainda que atrasado, o Brasil já avança no caminho do desenvolvimento de modelos
de assentamentos sustentáveis de baixo carbono.
Foto: Divulgação IPAM / Assentamento sustentável na Amazônia |
“Nós podemos ter uma reforma agrária de baixo impacto ao meio
ambiente, socialmente mais justa e economicamente mais eficiente. Estamos muito
atrasados”, admitiu por sua vez à IPS o diretor do programa de mudanças
climáticas do IPAM, Oswaldo Stella.
Os primeiros projetos de
assentamentos sustentáveis na Amazônia estão no estado do Pará, próximos aos
municípios de Altamira, Itaituba e Santarém: estão distribuídos no território
da Transamazônica e Xingu, Território do Baixo-Amazonas e Território da rodovia
BR-163 (que liga Cuiabá, no Mato Grosso, a Santarém, no Pará).
Financiado pelo Fundo Amazônia
com recursos da ordem de R$ 25 milhões para os próximos cinco anos, o desafio é
transformar os assentamentos da Amazônia, que historicamente são pouco
rentáveis e grandes geradores de gases de efeito estufa para uma economia de
baixo carbono capaz de manter os estoques de carbono florestal nos
assentamentos, explica Oswaldo Stella.
O projeto ainda é um modelo
piloto que está sendo desenvolvido para ser replicado a outras regiões da
Amazônia. Inicialmente, o projeto pioneiro se realiza em 21 assentamentos de
reforma agrária localizados na região oeste do Pará, contemplando 5.720
famílias numa área de mais de 500.000 hectares.
O coordenador do IPAM explica
que um modelo de baixo carbono envolve a adoção da estratégia de manejo
sustentável dos recursos naturais, a melhoria da produtividade agropecuária,
preservando ao mesmo tempo a floresta em pé e evitando a emissão de CO2.
A meta é impedir a emissão de
cerca de 1,8 milhões de toneladas de CO2 num período de cinco anos por 350
famílias inseridas num projeto específico de pagamento pelo desmatamento
evitado.
A reforma agrária no Brasil
tradicionalmente se deu por pressão popular graças à mobilização de movimentos
sociais. Segundo Celso Lacerda, a reforma se deu em um “ambiente tenso e,
consequentemente, foi feita de uma forma muito desqualificada”. O lema era
apenas distribuir terras sem qualquer tipo de infraestrutura ou assistência
técnica. Este processo, reconhece Lacerda, levou à favelização do campo.
“Muitos ficam em situação de miséria. Na década de 1990, foram
assentados cerca de 400 mil famílias nessas condições. Não há como pensar em
discutir produção sustentável sem haver infraestrutura básica”, disse o
presidente do Incra.
Há dois anos, o foco começou a
voltar-se para criar políticas diferenciadas para a mudança do modelo dos
projetos de assentamento. Antes, colonizar era sinônimo de desmatar. O corte e
a queima eram as únicas modalidades de cultivo agrícola dos pequenos
agricultores familiares.
“A agricultura voltada para a produção de commodities já tem
todos os instrumentos para funcionar, mas não a agricultura familiar.
Fortalecer a agricultura familiar na Amazônia reduz o desmatamento, a pobreza,
o risco à segurança alimentar e distribui renda. É uma ação com múltiplos
benefícios”, argumenta o coordenador do IPAM ao defender maior acesso às linhas
de crédito, assistência técnica, regularização fundiária e maior capacitação no
cultivo. “Estes são os principais elementos para construir um novo ambiente
para que essa agricultura possa se desenvolver”.
Hoje no Brasil, segundo dados
do INCRA, 940 mil famílias estão assentadas num território de quase 90 milhões
de hectares, correspondente a mais de 10% do território brasileiro com projetos
de assentamentos de reforma agrária. Contudo, muito ainda falta ser feito em
prol de modelos mais sustentáveis de assentamentos
.(IPS/TerraViva)
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