segunda-feira, 6 de julho de 2009


Brasil: "Não venham com o Acordo Ortográfico em cima da minha palavra" - escritor angolano Ondjaki

Rio de Janeiro, Brasil, 04 Jul (Lusa) - A reforma ortográfica da língua portuguesa carece de um maior debate para a sua implementação, defende o escritor angolano Ondjaki ao questionar o conceito de lusofonia e o “falso consenso” que existe entre os países em torno do Acordo.

Ondjaki está na edição da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), que decorre até dia 05, e foi convidado para participar num debate precisamente sobre o Acordo Ortográfico da língua portuguesa.

“Não me venham com o Acordo Ortográfico em cima da minha palavra”, realçou Ondjaki, mostrando-se contra a unificação da grafia e referir que não entendeu “bem os meandros do acordo”.

O jovem escritor, angolano representante de uma geração contemporânea de autores africanos de expressão portuguesa, disse à Lusa que, para ele, a reforma ortográfica “não faz sentido a título pessoal, é um desabafo de escritor”.

“Em quase todos os escritores, sobretudo quando se trata do conto e da poesia, há uma relação muito umbilical com a palavra. O acordo, para um escritor, fica mais duro, mais difícil de aceitar porque mexe com uma componente que é o corpo da palavra e nós temos uma relação visceral com a palavra, de ciúme, de posse”, salienta.

Ondjaki afirmou compreender que se faça um acordo, mas admite que lhe “custa”, como um poeta, aceitá-lo: “Doe-me no corpo da minha palavra que venham dar regras novas”.

O escritor diz ainda que mantém uma posição “mais contra do que a favor” e diz que gostaria de ver as coisas mais “bem explicadas” por parte de quem defende ao criticar a ausência de discussão entre os sectores da sociedade.

“Houve debate em cima de uma decisão que já estava tomada, não houve um debate que conduziu a decisão”, realçou Ondjaki para quem existe um “falso consenso” de oito países, em que apenas três deles assinaram o acordo.

“Leve o tempo que levar, há questões que têm que ser mais debatidas do que outras, não pode baixar uma lei, um decreto”.

Para Ondjaki, que se declara “satisfeito” com a sua relação linguística com os outros povos, “não resta dúvidas que é um desacordo ortográfico porque há pessoas a falar a favor e contra e ainda há uma questão em torno disso”.

Ele contra-argmenta que não tem havido um “convite a este debate” por parte de quem o promove: “Não promovem o debate, promovem o acordo, é diferente”.

Bastante crítico ao termo “lusofonia”, o jovem autor angolano que teve suas obras traduzidas para o francês, inglês e alemão afirma que o conceito lusofonia “tal qual é usado politicamente não tem eco nenhum na realidade social das pessoas”.

Na Flip, Ndalu de Almeida, nascido em Luanda, mais conhecido por seu pseudônimo Ondjaki, publica a sua mais nova obra infantil “O leão e o coelho saltitão”, pela Editora Língua Geral, além de ter lançado na última semana pela Companhia das Letras “AvóDezanove e o segredo do soviético”.

Nesta sétima edição da feira literária o homenageado é o poeta pernambucano Manuel Bandeira (1886-1968) e tem como destaque o romancista português António Lobo Antunes.

A programação oficial inclui 34 autores convidados para a feira que se realiza uma das mais antigas e históricas cidades brasileiras onde são esperadas entre 20 a 30 mil pessoas.

(Lusa/Fim)

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